O excesso de peso é um componente-chave da fisiopatologia do diabetes tipo 2 (DM2) e está associado a complicações dessa doença2,4,5
Uma abordagem que se preocupa com o excesso de peso o mais cedo possível, com o objetivo de atingir um controle glicêmico, poderia proporcionar mais benefícios clínicos do que focar apenas no controle glicêmico6
Como demonstrado em estudos pré-clínicos e sugerido por estudos em humanos5.
Entre os pacientes com DM2, o excesso de peso tem sido associado à elevação da hemoglobina glicada (HbA1c).6 Há também uma ligação entre hemoglobina glicada (HbA1c) e perda de peso: mudanças de estilo de vida que levam a uma redução do excesso de peso foram associadas a melhorias no controle glicêmico.7
Agora, veja como alterar a progressão do DM2 e melhorar a saúde a longo prazo dos pacientes abordando o controle da hiperglicemia o mais cedo possível, e saiba como o controle do excesso de peso pode colaborar para o controle glicêmico.6
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A Dra. Alice Cheng, Professora Associada da Universidade de Toronto, Canadá, compartilha porque é importante abordar o excesso de peso como parte do gerenciamento do DM2 e como abordá-lo de forma sensível e colaborativa com seus pacientes.
Abordando o peso em apoio ao controle glicêmico em pessoas com diabetes tipo 2
Olá e bem-vindos. Sou a Dra. Alice Cheng, endocrinologista no Trillium Health Partners e no Unity Health Toronto e professora adjunta na Universidade de Toronto. Estes são meus conflitos de interesse. Hoje, quero discutir um assunto importante: a necessidade de uma mudança de paradigma na forma de pensar o cuidado do diabetes. Como profissionais de saúde, trabalhamos com pessoas com diabetes e oferecemos orientação sobre estilo de vida e opções de manejo. E, geralmente, apesar dos melhores esforços, muitas pessoas ainda sofrem com hiperglicemia e ganho de peso. Como desafio adicional, a maioria das pessoas com diabetes tipo 2 também tem sobrepeso ou obesidade.1,2 Dados de vários países mostram que muitas pessoas com diabetes tipo 2 têm hemoglobina glicada, ou HbA1c, acima de 7% ou 53 milimols por mol, o que está acima dos alvos estabelecidos por várias diretrizes.1-6 Os dados mais recentes do US National Health and Nutrition Examination Survey, ou NHANES, mostram que quase metade, 49,5%, das pessoas com diabetes nos Estados Unidos tem HbA1c acima de 7%, apesar dos avanços recentes.1 O NHANES analisou a população com diabetes tipo 1 e tipo 2. Cerca de 90% da população total com diabetes têm diabetes tipo 2, e o corte transversal do NHANES provavelmente reflete uma distribuição similar. Portanto, podemos presumir que as descobertas do NHANES refletem principalmente as tendências para pessoas com diabetes tipo 2.1 As tendências de HbA1c não são exclusivas dos EUA. Quase metade, 46,4%, das pessoas com diabetes tipo 2 em países Europeus selecionados,2 51,5% no Japão,2 e quase três-quartos, 74%, no Brasil4 têm HbA1c acima de 7%. Então qual a relevância de algumas pessoas com diabetes tipo 2 também terem sobrepeso ou obesidade? Vamos discutir por que esse é um assunto de interesse e uma área que precisa de nossa atenção como profissionais de saúde. Evidências sugerem que, entre as pessoas com diabetes tipo 2, quanto maior o grau do IMC, maior a proporção de pessoas com HbA1c de 7% ou mais. Essa associação foi revelada através de uma análise dos prontuários médicos eletrônicos de pessoas com diabetes tipo 2 nos EUA. Este gráfico mostra que quase metade, 52,7%, das pessoas com obesidade grau 3 tinham HbA1c de 7% ou mais.7 Também gostaria de aproveitar para destacar que, embora o IMC seja muito usado para medir excesso de peso, a circunferência abdominal, que é uma medida indireta do excesso de gordura abdominal, também pode ser uma avaliação importante para algumas pessoas.8,9 Tanto o IMC quanto a circunferência abdominal estão fortemente associados à resistência à insulina, que, como sabemos, é um defeito fisiopatológico central no diabetes tipo 2.10-12 Há também uma confluência entre várias diretrizes sobre a importância de avaliar o excesso de peso e a adiposidade em pessoas com diabetes tipo 2, seja utilizando o IMC, a circunferência abdominal, a alteração do peso ao longo do tempo ou outras medidas antropométricas, conforme adequado, e identificar uma necessidade de intervenção. As diretrizes especificam que o IMC é uma ferramenta de triagem, mas não é, por si só, um diagnóstico de sobrepeso e obesidade, composição corporal ou da saúde.8 A circunferência abdominal pode ser adotada como outra medida para obesidade abdominal ou central, considerando valores de referência específicos por grupos étnicos.13 Além do peso e do IMC, a avaliação da distribuição do peso — especialmente a deposição adiposa central ou visceral — e do padrão e trajetória de ganho de peso pode ajudar a embasar a estratificação de risco e opções de manejo.9 O excesso de peso tem implicações na fisiopatologia do diabetes tipo 2 e em várias condições de saúde, incluindo dislipidemia, hipertensão e doença arterial coronariana.14 A hiperglicemia no diabetes tipo 2 foi associada a progressão de complicações microvasculares e macrovasculares.14 Dadas essas implicações a longo prazo do excesso de peso no diabetes tipo 2, uma intervenção na causa base (a montante) de controle de peso poderia permitir uma intervenção mais precoce no curso da doença.14 Portanto, uma abordagem de tratamento que inclua o controle de peso pode oferecer mais benefício clínico que uma abordagem que foque exclusivamente no controle da hiperglicemia.14 Evidências da associação entre redução de peso e melhora na HbA1c, na pressão arterial e lipídios foram demonstradas no estudo DiRECT. Esse estudo incluiu participantes diagnosticados com diabetes tipo 2 e excesso de peso por menos de 6 anos e com um IMC de 27 a 45 kg/m2.15 Os participantes foram atribuídos aleatoriamente a um grupo de intervenção, que recebeu um programa integrado e estruturado de controle de peso após interrupção dos medicamentos hipoglicemiantes ou anti-hipertensivos, ou ao grupo controle, que recebeu o melhor cuidado clínico, de acordo com as diretrizes.15 Os desfechos coprimários medidos neste estudo foram a perda de peso de 15 quilogramas ou mais e HbA1c abaixo de 6,5% sem o uso de medicação hipoglicemiante. Em 2 anos, apenas 11% dos participantes da intervenção e 2% dos participantes do controle atingiram esse critério para perda de peso, e 36% dos participantes da intervenção atingiram o critério para HbA1c, em comparação com apenas 3% no grupo controle.15 A análise post-hoc apresentada aqui foi conduzida para avaliar a redução na HbA1c por categoria de perda de peso, tanto no grupo da intervenção quanto no de controle. Os resultados mostraram que houve um aumento de 25% nas chances de atingir uma HbA1c menor que 6,5% por quilograma de peso perdido. Isto é, os participantes com maior perda de peso são mais propensos a atingir esse alvo glicêmico, e esses resultados aumentam a cada quilograma perdido. Os resultados mostraram que 70% dos participantes na categoria de maior peso pedido – 15 quilogramas ou mais – puderam atingir uma HbA1c abaixo de 6,5% sem medicamentos hipoglicemiantes, em 24 meses.15 Além disso, a pressão arterial sistólica, triglicérides e o colesterol HDL apresentaram grande melhora a partir do basal no grupo da intervenção, em comparação com o grupo controle em 24 meses.15 Agora que estabelecemos o importante papel de avaliar e abordar o excesso de peso e adiposidade no manejo do diabetes tipo 2, vamos conversar sobre como tratar disso de maneira colaborativa. Para iniciar uma conversa delicada sobre o peso, os profissionais de saúde podem pedir permissão para discutir o controle de peso.9 Avaliar quaisquer causas subjacentes que possam contribuir para o excesso de peso, incluindo desafios de estilo de vida ou fatores farmacológicos.9 E, então, orientar a pessoa sobre os potenciais benefícios da perda de peso em sua situação particular, discutindo potenciais opções de controle.9 Podemos destacar que, para muitas pessoas com diabetes tipo 2, a perda de peso pode ajudar a reduzir o açúcar no sangue, lipídios e pressão arterial.9,15. Depois, estabeleça metas de saúde e de peso com o paciente, utilizando uma linguagem não preconceituosa, como: "Como podemos estabelecer, juntos, metas de perda de peso que sejam realistas? Vamos discutir algumas mudanças que podem se adequar às suas prioridades".9 Por fim, reconheça que perder peso e mantê-lo é um desafio, e que a equipe de saúde trabalhará em conjunto, com metas de perda de peso que ajudem a manejar o diabetes tipo 2. 9,16 Em resumo, como profissionais de saúde, devemos considerar várias ferramentas que nos ajudem a diagnosticar o excesso de peso e sua distribuição e como isso pode ajudar a orientar e priorizar um plano de cuidado individualizado. Além disso, precisamos considerar valores de referência específicos por etnia como métricas e adotar abordagens que façam sentido culturalmente. Por fim, estamos todos de acordo que um cuidado abrangente do diabetes tipo 2, incluindo controle de peso, requer colaboração entre os profissionais de saúde e as pessoas com diabetes tipo 2. No final das contas, esta é uma jornada que percorremos em conjunto.9
Agora vamos explorar detalhadamente
Por que o peso é importante no DM2?
Referências
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